domingo, 25 de fevereiro de 2018

Meus filmes favoritos: análise de 007 - Cassino Royale
Parte 1


Introdução:

A franquia 007 é a maior do cinema em número de filmes, passando por 5 décadas desde o primeiro filme em 1962, desde então o agente britânico criado por Ian Fleming passou por diversos atores e estilos diferentes, cada filme refletindo o cenário politico-cultural da época em que foi lançado.

São por esses motivos (além de já gostar de histórias de espionagem) que me considero um fã do personagem, James Bond é protagonista de 26 filmes (2 não oficiais), 18 livros (14 de Ian Fleming) e 27 games eletrônicos, além de incontáveis homenagens e paródias do personagem.

A primeira aparição de 007 foi no livro Cassino Royale de 1953,  pelo autor britânico Ian Fleming, Fleming foi um espião da Inglaterra durante a Segunda Guerra Mundial, então ele tinha experiência e conhecimento na área, apesar dos livros seguirem uma ideia mais fantasiosa da verdadeira espionagem. Muito da personalidade de Bond veio do próprio Fleming, ele também era carismático e mulherengo, de muitas maneiras Bond é uma exageração de Fleming, é como ele queria ser visto.

Fleming, Ian Fleming

O livro foi um grande sucesso na época, e logo recebeu uma adaptação para a televisão em 1954, mas o agente seria apenas adaptado para a tela grande em 1962 com "007 contra o satânico Dr. No", estrelando Sean Connery como James Bond. Quando se trata das adaptações, elas não seguem a cronologia dos livros. Casino Royale foi feito novamente como paródia em 1967, estando fora da cronologia oficial dos filmes, o filme foi um fracasso de crítica e público.

Vale lembrar que o James Bond dos filmes é um tanto distinto do Bond dos livros, muito do que o personagem é nas adaptações é mais baseado na personalidade que Sean Connery atribuiu ao agente, essa imagem do herói que faz piadinhas enquanto mata seus inimigos, dá cantadas em todas as mulheres que vê e sempre sai impecavelmente vestido e arrumado depois das cenas de ação é construção de Connery e de Roger Moore depois dele.

Nos livros, apesar de ainda ser mulherengo e ter alguns momentos de humor, Bond é uma pessoa bem séria e fria, alguns momentos sendo um personagem trágico, ele é um ótimo espião e um ótimo assassino, mas ainda é bem humano, ele comete erros constantemente e acaba pagando caro por isso.

Nos cinemas essa imagem do herói imbatível durou por décadas, e os atores que tentaram trazer um lado mais humano acabaram sendo mal vistos pelos fãs, como George Lazenby e Timothy Dalton, o que mais tinha conseguido misturar essas duas imagens e se saiu bem sucedido tinha sido Pierce Brosnan, mas ainda era bem pouco.


007 sempre foi ameaçado de desaparecer do gosto popular em todas suas décadas, nos anos 60 com o término da era Sean Connery, nos anos 70 com a estagnação e ridicularização da era Roger Moore, nos anos 80 com as tentativas falhas de seriedade da era Timothy Dalton, e nos anos 90 com o rápido cansaço da era Pierce Brosnan, esse último culminou no lançamento de "007 - um novo dia para morrer" em 2002, que foi considerado um dos piores filmes de toda a franquia e parecia ter enterrado de vez o personagem.

Mas assim como em todas essas décadas citadas, sempre houve um filme do agente que acabou revitalizando a franquia, e durante seu período mais escuro, um segundo filme de espionagem também foi lançado em 2002, com um outro agente com as mesma iniciais que foi um sucesso de critica e público, esse filme era "A Identidade Bourne".

Jason Bourne pegava muita inspiração de 007, mas com uma ideia mais realista, ele era frio e sério como o Bond dos livros, a trama era muito mais politica e semelhante ao que a espionagem realmente é, as lutas eram violentas ao invés de engraçadas, e o clima parecia bem mais apropriado para a época em que foi lançado, enquanto Bond ainda estava lutando com vilões comunistas megalomaníacos (esquecendo que a guerra fria já havia acabado há uns 20 anos), Bourne lutava contra o próprio sistema que o criou, era mais condizente com a paranoia pós 11 de setembro nos EUA, e ainda conseguia ser um filme empolgante e divertido de ação.


Com essa concorrência nova, Bond precisava de uma repaginada urgente, e com isso os produtores voltaram ao romance original, não havia melhor forma de reinventar Bond do que com sua primeira história, e Cassino Royale seria finalmente adaptado da forma correta para os cinemas. O diretor Martin Campbell foi escolhido para dirigir essa reimaginação da franquia, isso por já ter revitalizado 007 nos anos 90 com Goldeneye, e o novo James Bond seria uma escolha bem polêmica, o ator Daniel Craig.

Muitos fãs acharam uma péssima escolha, não que considerassem Craig um mal ator, mas pelo simples fato dele ser loiro, de acordo com a descrição de Ian Fleming, ele deveria ter o cabelo escuros, e todos os Bonds até então seguiram esse padrão. Pode parecer algo ridículo hoje, mas na época muitos reclamaram e até se recusaram a ver o filme por causa disso.

007 - Cassino Royale estreou em 17 de novembro de 2006 nos Estados Unidos, foi um mega sucesso de bilheteria (sendo o filme mais rentável da franquia até então) e o mais bem avaliado também, com 94% de aprovação no Rotten Tomatoes.


Com essa introdução feita, irei agora dissecar a película inteira e comentar porque acredito que esse é o melhor filme de 007 já feito de todos os 26, e porque é um dos meus filmes favoritos.


Análise:



Cassino Royale começa com uma sequência estilosa em preto e branco que imediatamente dá o tom resto do filme, Bond é mandado para matar um traidor da MI6 em Praga, após já ter matado o informante do traidor em um banheiro. Assim que ele termina o trabalho, Bond recebe sua licença para matar e seu status de 007.

Essa cena evoca o sentimento de um filme noir, um momento é definido pela atmosfera e tensão da conversa entre Bond e o traidor, e outro momento é definido por uma luta brutal no banheiro. Também mostra a astúcia de Bond ao descarregar a arma do traidor antes dele chegar no quarto, ficamos sabendo que ele é um personagem inteligente, violento e carismático.

No final da sequência temos o que seria a origem da icônica imagem de dentro do cano da arma, que está em todos os filmes da franquia desde "007 contra Moscou", geralmente os outros começam dessa forma sem nenhum contexto prévio, mas como esse deveria ser um reboot do personagem, o momento faz sentido na trama.


Então começa outro momento icônico dos filmes de 007, os créditos iniciais, ao som de You Know My Name de Chris Cornell, os créditos tem uma animação baseada em cartas de poker, não é a melhor abertura da série, mas faz bem seu trabalho. Considero a melhor música por gosto pessoal, é uma faixa bem rock n' roll que combina com o estilo do filme. Alguns anos atrás escrevi um post falando sobre esse tema em mais detalhe.


Depois temos a cena que introduz o vilões Le Chiffre (Mads Mikkelsen) e Mr. White (Jesper Christensen) em Uganda negociando com figuras bem suspeitas. Le Chiffre aparenta ser um vilão bem típico de 007, com seu visual excêntrico (leia-se europeu), deformidade no olho direito que o faz chorar sangue e asma, mas ele é um pouco mais complexo que isso, enquanto outros vilões da série querem dominar ou destruir o mundo, Le Chiffre é apenas um bandido que deve uma boa soma de dinheiro para uma organização criminosa (que os fãs antigos da franquia já devem saber qual), e Mr. White é apenas um agente dessa organização que observa as ações de Le Chiffre.


Mikelssen foi uma ótima escolha, ele é um ator que consegue ser intimador quando quer, mas que ainda é bem vulnerável comparado a organização, ele consegue passar isso muito bem, ele é perigoso, mas também parece assustado.


Já White mal parece humano, ele representa a face invisível da organização, age como um espectro, ele parece trabalhar para algo muito maior que os perigos dessa história, Jesper Christensen foi muito bem escolhido.

Depois disso começa a primeira grande sequência de ação do filme, uma perseguição com parkour em Madagascar, onde Craig mostra que seu Bond não tem medo de se sujar e se quebrar, enquanto o capanga tem certa graciosidade em seus movimentos, Bond é como se fosse uma máquina incontrolável perseguindo a qualquer custo.



Essa já é um dos melhores momentos de ação em toda a franquia, é tudo que uma cena desse tipo deve ser, é bem filmada, bem coreografada, criativa, brutal e muito divertida. Vale lembrar que Craig fez quase todas as cenas sem o uso de dublê, ele passou meses construindo o físico para poder filmar cenas desse tipo.

Após pegar a mochila do capanga, Bond olha o celular e encontra uma mensagem de Ellipsis, e ele passa a investigar o que significa isso.


Cortamos para um iate em um porto onde temos uma cena bem 007 de uma moça subindo as escadas depois de um banho de mar.


Dentro do iate, Le Chiffre está mostrando seus conhecimentos de Poker para dois jogadores, e vê em um laptop a notícia que um agente britânico matou um prisioneiro desarmado em Madagascar, ele cita a Ellipsis de modo misterioso.

 Agora vemos M (a chefe de Bond) xingando as ações de 007 em Madagascar, falando que se um agente fizesse isso na época da guerra fria, ele teria a decência de desertar. Corta para Bond em um quarto pesquisando o celular e ele descobre a ligação de Ellipsis foi feita em Bahamas, ele então invade o apartamento de M, que o xinga novamente e diz para ele tirar férias, Bond usa isso para ir para as Bahamas e investigar por conta própria.


Então temos outra cena bem 007 dele chegando em Bahamas com puro estilo, andando de carro e recebendo uma bela olhada da modelo gaúcha Alessandra Ambrosio, que faz uma cameo no filme.


Essa sequência de cenas é bem engraçada e evoca memórias dos filmes dos anos 60, onde Bond tem um magnetismo para todas as mulheres em cena, o que faz sentido no filme, Bond precisa usar seu charme para conseguir informações. Ele consegue entrar na segurança do hotel e  vê que o homem que fez a ligação dirige um Aston Martin, ele então pede a recepcionista se ela conhece o dono do carro e ela responde que o nome do homem é Sr. Dimitrius.


Temos então outro momento 007 puro com uma mulher andando de cavalo numa praia, enquanto Bond toma um banho de mar, ela então olha para ele, e somos apresentados a nossa primeira Bond Girl do filme, a bela Solange (Caterina Murino).


Bond usa o nome e senha de M (eles nunca explicam como ele conseguiu) para investigar quem é Dimitrius e quem são seus parceiros conhecidos, entre eles está Le Chiffre. Bond então vai até onde Dimitrius está jogando poker, ele entra no jogo, Solange aparece com um belo vestido e beija a testa do jogador.


Ele não parece muito impressionado.


Bond por outro lado, está bem impressionado.

Dimitrius faz a jogada genial de apostar tudo (incluindo o carro) no jogo, Bond obviamente ganha, e decide dar uma carona para Solange em seu novo Aston Martin.


Dimitrius conversa com Le Chiffre, e aceita fazer um trabalho para a organização. Enquanto isso, Bond esta se divertindo com Solange em seu quarto de hotel, quando o celular dela toca e ela fala com Dimitrius, Bond consegue ouvir que ele irá para Miami, sabendo disso, ele deixa a coitada de lado e vai embora.


Apesar de que muitos homens provavelmente ficaram decepcionados com a escolha de Bond, essa cena é interessante para mostrar que ele prioriza a missão acima de tudo, ele apenas a usou para conseguir informações e seguir Dimitrius, no momento em que ele consegue, não há mais motivos para ficar ali.

Isso é algo que Connery e Moore jamais fariam, por medo de "fragilizarem" suas masculinidades, já o Bond de Craig não tem tempo para isso, ele é macho demais para se preocupar.

007 segue Dimitrius até uma exposição de arte bem estilosa que usa corpos mumificados, observa e vê que ele coloca uma chave com o número 53 em uma mesa de cassino.


Bond então é surpreendido por Dimitrius, mas logo vira a faca e mata seu adversário, ou seja, Dimitrius morreu como viveu, como um completo idiota.


Bond olha o celular de Dimitrius e vê que ele ligou recentemente para Ellipsis, ele olha novamente para a mesa de cassino e vê que a chave sumiu.


Bond sai da exposição e liga para Ellipsis, um homem com uma bolsa atende o celular e Bond passa a o seguir.


Bond o segue até o aeroporto e fica vigiando o homem, o homem nota que está sendo seguido, abre a bolsa e veste um uniforme de guarda, Bond o segue até um hangar, onde irá acontecer a inauguração do maior avião do mundo, aparentemente o homem irá colocar uma bomba no avião a mando da organização.

O que se segue é a segunda grande sequência de ação do filme, a perseguição do aeroporto é o tipo de cena que geralmente seria usada no final de qualquer outro filme de ação, pois ela também é magistralmente dirigida, o sentido de urgência é bem real, é uma parte que lembra os melhores momentos de Caçadores da Arca Perdida e de Velocidade Máxima.


Após essa segunda dose de adrenalina, Le Chiffre faz uma ligação dizendo que perdeu mais de 100 milhões de dólares por conta da intervenção de Bond, e isso será o principal ponto do resto do filme que ligará com o livro, Le Chiffre participara de um jogo de poker multimilionário com o objetivo de arrecadar esse dinheiro de volta e pagar a organização, senão ele será assassinado.


O livro de Ian Fleming já começa durante o jogo, então toda essa parte até aqui foi um enorme prólogo, Cassino Royale parece dois filmes juntos em um só, e enquanto isso poderia dar muito errado, funciona perfeitamente aqui, ele introduz todos os personagens de forma orgânica, não é preciso de um dialogo expositivo vagabundo no meio das cenas seguintes, pois o filme já apresentou muito bem qual é a trama e o que está em jogo nessa primeira hora.

Por isso, e para não deixar essa postagem estupidamente longa, eu dividirei em duas partes, enquanto essa primeira parte do filme se foca mais na ação e introdução do personagem de volta as telas, a segunda parte se foca mais no jogo de poker, na tensão entre os jogadores, e devo dizer que é uma adaptação bem fiel ao livro em suas devidas proporções.

Até a próxima parte.




 

 




Nenhum comentário:

Postar um comentário